Cheguei ao mecânico e dei com a cara na porta. Já esperava o
conserto ficar pronto por três dias e sempre com a mesma promessa de que no dia
seguinte, logo pela manhã, poderia ir buscar. Tinha inclusive atendido o pedido
de uma parte do valor adiantado, para a necessidade da reposição de alguma
peça. Após alguma espera, um funcionário chegou e observei o carro ainda
desmontado sem qualquer sinal de que o trabalho tivesse sido executado.
Fiquei muito aborrecido e decidi ir buscar o dono da oficina
em sua casa, irritado pela falta de responsabilidade. Chegando no portão de sua
residência, o peguei no pulo. Estava saindo e tentou até fazer de conta que não
havia me visto. Sem graça, já foi prometendo que o carro ficaria pronto para o
dia seguinte logo cedo, igual às outras vezes. Pensei em explodir com ele, mas
alguma coisa me segurou e pude perceber que estava com os olhos vermelhos e o
rosto muito tenso. Perguntei o que acontecia, e ele iniciou uma “desculpa de
mecânico”, a qual interrompi, olhando bem em seus olhos dizendo:
- Não estou falando do carro, falo de você! O que aconteceu?
Ele desabou. Começou a chorar segurando minha mão como se
fôssemos velhos conhecidos. Contou que a esposa tinha passado por vários exames
médicos e o resultado da biópsia acabava de sair: Um tumor maligno! Continuou
falando dos detalhes de tudo, sempre muito emocionado. Ao final, já enxugando
as lágrimas, começou a querer desculpar-se pela demora, onde eu o interrompi
novamente.
- Amigo, todos temos prioridades em nossas vidas. No
momento, sua prioridade é sua esposa. Entendo que não queria expor sua vida
pessoal aos funcionários e clientes, e que também não pode recusar trabalho em
um momento que ainda nem sabe o quanto de gasto pessoal terá que enfrentar.
Porém, se você me permitir, posso conversar com seu pessoal de maneira que
orientem os clientes a compreender a demora e ficarem tranquilos quanto ao
cumprimento dos serviços.
Ele voltou a chorar e agradecer. Disse que não falava do
assunto por não saber como se expressar, que poderia ser mal interpretado em
sua natural rudeza.
Ao me despedir dele, com lágrimas, eu também agradeci ao Pai
a oportunidade. Entendi o quanto poderia ter desencadeado uma triste situação
explodindo em meu aborrecimento, se não tivesse percebido que aquele senhor
estava sofrendo por motivos muitos maiores que minha insatisfação em ficar sem
carro por mais um dia.
Nunca sabemos o que verdadeiramente se passa na vida, ou na
mente das pessoas. Algumas vezes não compreendemos as atitudes dos outros e
poucas vezes paramos para tentar entender suas atitudes ou buscar os motivos
delas.
É tão fácil julgar, se aborrecer, encontrar culpas nas
outras pessoas. Não temos como avaliar o que cada um já passou em sua vida, não
calçamos seus sapatos! Você pode considerar que seu caminho é o certo, mas
nunca poderá considerar que o seu é o único caminho.
Ele precisava chorar e tirar um pouco do peso de seus ombros
para poder agir com mais consciência e responsabilidade. Passei, deste dia em
diante, a procurar conhecer os motivos de cada um, mesmo quando fizessem coisas
que me chateassem, ou que me sentisse agredido. É preciso ao menos procurar
entender, mesmo que não concordemos, os motivos dos outros.
Kazagrande
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