E lá estava, na cidade sagrada de Tiahuanaco, frente a Porta
do Sol! Parecia que poderia tocar a energia emanada daquele local e apertá-la
de encontro ao peito. Sorria com a felicidade daquela realização! Ao retornar
ao hotel recebi um recado deixado pelo meu sócio, que não conseguia me chamar
no celular de sinal sofrível naquela região. Deveria interromper minhas
primeiras férias em vários anos e retornar imediatamente para Cochabamba. Uma
grande Universidade queria contratar os serviços de nossa consultoria, porém
exigia exclusividade e queria que agregássemos funcionários indicados por eles.
O valor negociado era muito maior do que ganhávamos com todos os outros
trabalhos que já estávamos realizando, porém implicaria em encerrar outros
contratos e demitir a maioria dos funcionários, para incorporar os indicados,
que seriam, inclusive, pagos pela contratante.
A felicidade que carregava, por ter realizado aquela viagem,
naquele local tão especial e intimamente ligado a uma das origens de nossa
tribo, esvaiu-se por completo. Fiquei tenso, preocupado, considerando todas as
variantes. Gostava muito do trabalho que já realizava, era lucrativo e ainda
havia o fator humano, pois desenvolvi um grande carinho pela equipe que treinei
como funcionários.
Por um lado, era uma grande oportunidade de ganhar muito
dinheiro de uma só vez e com menos trabalho, por outro, a consciência me
incomodava, ou melhor, a intuição gritava algo que não entendia. Ao retornar à
ligação, entre os cortes da chamada, acabamos discutindo, e encerramos a
conversa sem decidir nada e sem marcar meu retorno.
Naquela noite não dormi. Fiz o possível para esconder da
família a possibilidade de retorno imediato sem concluirmos o restante da
programação prometida há tanto tempo. Tive sonhos confusos, que saltavam de
cenas de guerra entre Incas e Espanhóis, para um belo templo coberto de ouro e
tecidos coloridos. Acordei com a imagem da face de meu sócio usando um pesado
elmo espanhol.
Decidi não ligar de novo naquele dia, e partimos para a
Cordilheira Real, no alto dos Andes. Uma aventura que teria aproveitado melhor
com a mente livre e sem as preocupações que passaram a me assombrar em relação
à decisão a ser tomada. A quase 6.000 de altitude, em meio a belíssima neve que
nos brindou com sua forte presença, sentei-me em um platô de pedra, onde ficava
uma estranha pirâmide, e pedi ao Pai que me mostrasse o que meus olhos não
conseguiam ver.
Uma profunda tristeza me invadiu e pude perceber que não
estava feliz com a oportunidade que se abria. Entendi, como se estivesse vendo
um filme dentro da cabeça, que desejava muito o dinheiro, e que já venci todas
as negações que bloqueavam a riqueza. Dinheiro sempre será bom, mas deve ser
aplicado para coisas boas! Não existia mais nenhum paradigma de sofrimento,
pobreza, ou de culpa por querer ter dinheiro. Entendi que aquela tristeza que
sentia, seria a tristeza que causaria às pessoas que deixariam de poder contar
comigo... Funcionários que seriam demitidos e clientes que voltariam a se
sujeitar aos péssimos serviços oferecidos pela única concorrente.
“Uma decisão só é difícil quando não sabemos realmente quem
somos”.
Será que eu sabia? Será que eu queria saber?
Sentado naquela pedra eu decidi quem eu queria ser!
“Terá toda ajuda que precisar, mas nunca esqueça que será o
mestre de si mesmo e o único guerreiro capaz de levá-lo a vitória”.
No dia seguinte telefonei de uma central telefônica, onde o
sinal era melhor. Fui extremamente cortês e usei toda a paciência, que nem
sabia existir dentro do meu ser. Após alguns arroubos, ele se acalmou e
concordou em me esperar até o início da semana seguinte, para tomarmos nossas
decisões. Esta ligação permitiu minha mente voltar ao estado de felicidade e
aproveitar o restante da viagem, sem sequer lembrar do que me esperava na
próxima segunda-feira.
Quando nos encontramos comuniquei minha decisão em não
aceitar a proposta. Ele surtou e, encurtando o relato, decidimos separar a
sociedade, para ele seguir com a nova universidade, deixando para mim os
clientes que já atendia. Nenhum dos funcionários quis seguir com ele, fato que ele
praticamente comemorou.
Aproximadamente um ano depois a Universidade, com seus
funcionários treinados, rescindiu o contrato. Ele recebeu um bom dinheiro e
desistiu do ramo, enveredando pelo ramo da construção civil. Não tivemos mais
contato, mas soube que passou por um grande período de depressão que consumiu
grande parte do dinheiro.
Decisão certa ou errada? Nunca me questionei, pois entendo
que o certo para mim, pode ser diferente do seu. Sei que segui a vida guardando
na mente as lembranças positivas daquela viagem. O momento que entendi a força
das palavras que sempre disse aos sofredores: Podemos ter tudo, mas a paz é uma
conquista que só se adquire com o amor!
Kazagrande
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